4 de mar. de 2008

ENTREVISTA COM GABRIEL BÁ

Gabriel Bá é um talentoso quadrinhista, nasceu em São Paulo e trabalha em conjunto com seu irmão gêmeo, e também quadrinhista, Fábio Moon. Os dois tem trabalhos publicados no Brasil, Estados Unidos, Espanha e Itália. Já ganharam os troféus HQ Mix, Angelo Agostini e Xeric Foundation Grant. A coleção 10paezinhos já ganhou vários prêmios HQ Mix incluindo Melhor Edição Especial Nacional e Melhor Revista Independente em 2006. Em 2007 Gabriel Bá foi chamado para trabalhar no projeto The Umbrella Academy escrito por Gerard Way, vocalista da banda americana My Chemical Romance. Gabriel faz as ilustrações da revista publicada pela pela editora Dark Horse.
Para Saber mais informações sobre o trabalho de Gabriel Bá visite http://www.10paezinhos.com.br/

Photobucket

Como você começou a se interessar por quadrinhos? Quando você decidiu se tornar um quadrinhista?Sua família o apoiou na decisão de se tornar um quadrinhista ou você teve que convencê-los, já que essa não é uma profissão tão comum?

Gabriel: Eu desenho desde pequeno e sempre li Histórias em Quadrinhos. Minha mãe sempre gostou e comprava as revistas e lia conosco. Quando o Fábio e eu tínhamos uns 14 anos, vimos que HQ era realmente o que queríamos fazer. Fizemos faculdade de Artes Plásticas, mas nunca deixamos de ir atrás do nosso sonho, continuando a fazer pequenas histórias e fanzines. Quando nos formamos, começamos a trabalhar mais intensamente no mercado editorial e as coisas começaram a entrar nos eixos. Sempre tivemos apoio da família, pois eles viam que nosso interesse era genuíno e que nossa dedicação era séria, não era só uma brincadeira.

Você tem um irmão gêmeo, Fábio Moon, que também desenha HQs. Como se deu essa relação entre os dois e a paixão pelos quadrinhos? Já houve algum tipo de competição entre os dois pra saber quem desenhava melhor?

G: A minha relação com o Fábio é o maior diferencial que nosso trabalho tem em relação a outros autores de Quadrinhos, pois temos uma colaboração constante e isso ajuda muito no resultado final. Sempre houve uma pequena competição saudável, mas isso só ajudou para que nós dois fizéssemos sempre o máximo da nossa capacidade, pois o outro estava sempre fazendo o dele.

Você trabalha muito em conjunto com seu irmão nos quadrinhos, como na criação da série 10 pãezinhos. Até que ponto você acha que seu trabalho é influenciado pelo dele e o dele influenciado pelo seu?Qual o melhor e o pior de trabalhar com seu irmão gêmeo?

G: Nossa vida inteira sempre foi muito compartilhada e isso cria uma dinâmica na nossa relação que se estendeu ao nosso trabalho também. Nos entendemos muito bem e muito rapidamente, sem precisar de muitas explicações e isso ajuda muito, torna as coisas mais naturais. Nós dois temos a mesma paixão e envolvimento com o que fazemos e isso é o mais difícil de encontrar num parceiro de trabalho. Não tem lado ruim de trabalhar com o Fábio, na verdade.

Você é formado pela USP em Artes Plásticas. Você acha a sua formação acadêmica importante no seu trabalho? E quanto da sua formação você acha que influencia no seu trabalho?

G: Foi muito importante para nós dois a faculdade, por nos ajudar a desenvolver um senso crítico do nosso trabalho, além de sempre contextualizar a arte com seu momento histórico. A arte sempre é um reflexo do momento que foi criada e vemos isso muito claro no nosso trabalho também. Além disso, conhecemos muitas pessoas com trabalhos diferentes dos nossos e isso também ajuda a conhecer melhor os limites do nosso trabalho.

Seus trabalhos tem uma característica muito própria e diferente do que se encontra nos quadrinhos. Que quadrinhos você diria que tiveram influencia no seu estilo de desenhar?

G: Gostamos muito de histórias cotidianas, onde o leitor identifica os cenários ou as situações com o que ele próprio vive. Mesmo quando se trata de uma ficção científica ou uma fantasia, é importante colocar elementos para o leitor se relacionar. Quem faz isso muito bem é o Laerte e ele é uma das maiores influências no nosso trabalho. O Will Eisner também sempre colocou muito da sua vida e seu cotidiano nas suas histórias e isso se vê refletido nas nossas.

Quais quadrinhos e que histórias você diria que são seus favoritos? Você coleciona livros de quadrinho?

G: Tem um pouco de tudo, pois já lemos muita coisa. Se fosse pra escolher alguns, seria "Bone", do Jeff Smith; "Watchmen", do Alan Moore e Dave Gibbons; "O Cavaleiro das Trevas", do Frank Miller; "Lobo Solitário", de Kazuo Koike e Goseki Kojima; "100 Balas", do Brian Azzarello e Eduardo Risso; e "O Edifício", do Will Eisner.

O que você acha da onda de filmes baseados em quadrinhos como X-men, O Motoqueiro Fantasma, Homem Aranha e tantos outros?

G: Alguns são bons, por conseguir transpor a essência da história para o filme, outros são uma porcaria.

Será que um dia veremos seus quadrinhos em uma telona? O que você acharia disso?

G: Não pensamos muito nisso. Precisaria ser bem feito, com o nível de qualidade que impomos ao nosso trabalho.

Seu primeiro trabalho publicado nos Estados Unidos, a serie ROLAND, ganhou o prêmio Xeric Foundation Grant. Como foi receber um prêmio logo na primeira publicação?

G: Este prêmio serve pra incentivar Quadrinhos independentes e foi isso que aconteceu com o ROLAND. Mandamos o projeto dois anos seguidos. Na primeira vez, só tínhamos um capítulo a lápis e mais três pro fazer, e não fomos premiados. No segundo ano, já tínhamos 75% do material pronto e aí sim fomos escolhidos. Ajudou muito na parte financeira, mas principalmente na parte de divulgação do projeto, pois o prêmio também incluía anúncios em revistas especializadas.

Com o livro Autobiographix publicado pela Dark Horse você, juntamente com seu irmão teve a oportunidade de trabalhar com lendas dos quadrinhos como Frank Miller e Will Eisner. Como surgiu o contato da Dark Horse para o Autobiographix? E como foi trabalhar com nomes de peso dos quadrinhos?

G: Nós já vínhamos mostrando nossas histórias para a Diana Schutz, editora da Dark Horse, há alguns anos e ela nos convidou pra participar desta coletânea por acreditar que nosso trabalho combinava muito com o conceito do livro, somente com histórias autobiográficas. O fato de publicarmos ao lado de nomes como o do Will Eisner, Frank Miller e outros só nos motivou mais a aceitar o convite e nos esforçarmos ao máximo. Foi uma experiência única que não se repetirá outras vezes. Foi uma honra.

Você abriu muitas portas para novos artistas entrarem no mercado. Como o trabalho de artistas brasileiros é visto em outros países?

G: O mercado está crescendo e sempre tentamos incentivar artistas a produzir mais, mostrar mais seus trabalhos. Quando achamos que um trabalho se destaca, é nosso dever divulgar isso para que pessoas também fiquem conhecendo aquele artista ou aquela história. Os brasileiros são muito bem vistos em outros países, o maior problema é interno mesmo, pois não temos muita valorização da nossa profissão aqui no Brasil.

No ano passado o seu trabalho De:TALES pela Dark Horse foi eleito pela Booklis um dos 10 melhores contos de quadrinhos do ano e ganhou medalha de prata pela Foreword Magazine como Livro do Ano. Como e receber prêmios tão importantes nos quadrinhos? É desafiador para a criatividade ou apenas o reconhecimento de um trabalho?

G: Por um lado chega a ser inacreditável o reconhecimento que o De:TALES está recebendo, mas é resultado de anos de esforço e determinação. Isso só nos mostra que estamos no caminho certo e nos motiva a continuar fazendo mais e melhor sempre.

Seu mais recente trabalho The Umbrella Academy também pela Dark Horse foi lançado agora em Setembro e tem parceria com Gerard Way, vocalista da banda My Chemical Romance. Como você se envolveu nesse trabalho morando no Brasil?

G: O Scott Allie, editor da Dark Horse responsável pelo projeto, já conhecia meu trabalho e mostrou para o Gerard e ele gostou e aí eles vieram atrás de mim. Me mostraram o projeto, alguns desenhos dos personagens e eu topei participar. Foi tudo bem inesperado e bem rápido.

Como você conheceu Gerard Way?

G: Foi resultado do projeto. Encontrei com ele em duas ocasiões, ambas na Comic Con de San Diego, em 2006 e 2007.

Gerard também é formado em artes e escreve a história e o roteiro para o Umbrella Academy. Como é pegar as visões dele e transformar em suas visões para os desenhos?

G: O estilo do Gerard é bem bacana e foi fácil adaptá-lo ao meu na hora de criar o universo do "Umbrella Academy". Ele sabe muito bem o que quer, tem um repertório de referências muito bem definido e é só seguir esta linha que nos entendemos muito bem. Ele tem gostado muito das páginas e isso é ótimo para o andamento do projeto.

É mais difícil por ele estar em constante turnê com a banda ou você tem tempo pra trabalhar nos desenhos e no processo criativo com ele?

G: O mais difícil para ele é conseguir parar e escrever, realmente. É o que demanda muita concentração e com a turnê ele não tem muito como se dedicar inteiramente a isso. Mas o processo de criação da revista vai bem, pois ele está sempre disponível pra aprovar e dar opiniões sobre o meu trabalho e nos falamos diariamente por e-mail.

Uma previa do The Umbrella Academy foi distribuída esse ano no Free Comic Book Day que acontece em Nova Iorque e você fez uma tarde de autógrafos no Comic Com de 2007. Como você diria que foi a receptividade entre os aficionados por quadrinhos?

G: Ainda não tenho muito retorno dos fãs de Quadrinhos e acho que só teremos uma idéia real da reação do público quando a série começar em setembro.

Você alguma vez se preocupou que seu trabalho no Umbrella Academy fosse visto apenas por fans da banda My Chemical Romance e não por pessoas genuinamente interessadas em quadrinhos?

G: Me preocupo mais que os fãs da banda só comprem a revista por ser o Gerard que escreve, sem se interessarem realmente pela história.

The Umbrella Academy tem uma versão em português prevista para se lançada?
G: Ainda não.

Como é saber que hoje garotos se inspiram pelas suas historias e pelos seus desenhos?

G: Sobre pessoas se inspirarem pelo meu trabalho, fico feliz, mostra que estou atingindo as pessoas e é uma motivação a mais pra continuar produzindo novas histórias.

Qual o próximo passo para dois irmãos já tão consagrados no universo dos quadrinhos? O que podemos esperar do seu trabalho?

G: Este ano vamos lançar ainda uma coletânea das histórias curtas do 10 Pãezinhos ainda fanzine, que datam de 1997 a 2001, para mostrar um pouco do processo de evolução do nosso trabalho. Pretendemos lançá-lo em Outubro. Além disso, continuamos a pensar e produzir novas histórias. Não se pode ficar acomodado, é preciso continuar e crescer sempre.

Qual o conselho e que dicas você daria para aqueles que tentam construir uma carreira como quadrinhista?

G: Produzir sempre. Somente produzindo regularmente é que seu trabalho vai evoluir e melhorar. E mostrar o seu trabalho é importante, pois só quando as pessoas nos apontam os defeitos no nosso trabalho é que podemos corrigi-los e crescer como Quadrinhistas.

Entrar no mercado dos quadrinhos pelo dinheiro ou pela paixão?

G: Sempre pela paixão. O dinheiro é um resultado.

Um comentário:

layp disse...

entrevista feita em agosto de 2007 antes do lançamento oficial de Umbrella Academy